Reviravolta na história: Menino de Gran Dolina é, na verdade, menina

Segundo estudo publicado na edição de março do periódico científico Journal of Anthropological Sciences, a equipe de cientistas do Centro Nacional de Investigação da Evolução Humana da Espanha conseguiram confirmar o sexo de dois ancestrais humanos encontrados nos sítios arqueológicos da Sierra de Atapuerca, na cidade espanhola de Burgos, em 1991.

Foram avaliadas as ossadas de dois indivíduos da espécie Homo antecessor, que viveu na Europa entre 800.000 e 1,2 milhão de anos atrás. Eles estavam na caverna de Gran Dolina.

A pesquisa mostra que os caninos encontrados no sítio arqueológico espanhol apresentam diferenças comparáveis às observadas entre homens e mulheres modernos. Isso permitiu estabelecer que um era provavelmente do sexo masculino, enquanto o fóssil conhecido mundialmente como Menino de Gran Dolina, na verdade, é do sexo feminino.

Vários pesquisadores ao longo dos anos avaliaram os esqueletos, mas até agora não tenha sido possível avaliar o dimorfismo sexual deles. Isso porque a maioria dos indivíduos achados em Gran Dolina são imaturos, ou seja, não chegaram à adolescência. Além disso, os arqueólogos encontraram apenas pequenos fragmentos dos nossos ancestrais.

“Até o momento, sabíamos apenas o sexo de um fragmento de dente, do qual foram obtidas as proteínas do esmalte. Mas nosso estudo abre agora uma forma nova e altamente confiável de estimar o sexo por um método não invasivo”, explica José María Bermúdez de Castro, codiretor dos sítios arqueológicos de Atapuerca e coautor do estudo, citado pelo site do Centro Nacional de Investigação da Evolução Humana.

Precisão de até 92,3%

A estimativa do sexo dos Homo antecessor que viveram na região de Burgos foi possível graças às dimensões do esmalte e da dentina nos caninos, que são características do dimorfismo sexual.

Esses parâmetros foram empregados anteriormente para estimar o sexo em amostras forenses, alcançando uma taxa de precisão de até 92,3%, de acordo com a pesquisa. A técnica também ajudou na identificação de outros ancestrais humanos: o neandertal de Krapina, na Croácia, e nos 29 indivíduos da caverna espanhola de Sima de los Huesos, na Sierra de Atapuerca.

De acordo com os pesquisadores, os dentes oferecem a vantagem adicional de terem uma formação completa mesmo no estágio inicial da vida humana, ou seja, permitem que o sexo seja estimado em indivíduos imaturos.

Menina de 9 a 11 anos

O resultado mais interessante do estudo recente foi a constatação de que os restos mortais do chamado Menino de Gran Dolina pertenciam, na verdade, a uma menina de 9 a 11 anos.

“Esse indivíduo é representado por uma face parcial e um fragmento do osso frontal, embora apareça em fotografias com uma mandíbula encontrada em 2003 que, curiosamente, é provavelmente do sexo feminino”, afirma a pesquisadora Cecilia García-Campos, coautora do estudo, citada pelo site do Centro Nacional de Investigação da Evolução Humana.

A Menina da Gran Dolina provavelmente tinha uma estatura e proporções corporais semelhantes às de uma garota moderna com a mesma idade, embora possa ter se desenvolvido mais cedo.

Os cientistas não possuem muita informação sobre como teria sido a vida da jovem há mais de 800.000 anos, mas sabem algo sobre o fim de sua vida. Segundo o estudo recém-divulgado, os restos mortais encontrados na caverna de Gran Dolina, incluindo os da menina, mostram evidências de canibalismo, provavelmente como resultado de um confronto entre grupos rivais.