Ciência

Minicérebro criado em laboratório inova ao ser capaz de jogar Pong

Cientistas cultivaram células cerebrais que foram capazes de "perceber" o ambiente e jogar o game clássico dos anos 1970

Por João Paulo Martins  em 13 de outubro de 2022

O “minicérebro” criado em laboratório foi capaz de jogar Pong, game clássico criado em 1972 (Foto: Imaginary Cloud/Reprodução)

 

Pesquisadores cultivaram células cerebrais em laboratório e fizeram com que aprendessem a jogar Pong, game de rebater bolinha criado em 1972. Eles dizem que esse “minicérebro” pode sentir e responder ao ambiente.

Os achados foram publicados na última quarta (12/10) na revista científica Neuron. Citado pela emissora estatal britânica BBC, o pesquisador Brett Kagan, da empresa australiana Cortical Labs, um dos autores do estudo, é a primeira vez que se cria em laboratório um cérebro capaz de “perceber” – mas sem consciência.

“Não encontramos um termo melhor para descrever o dispositivo. Ele é capaz de receber informações de uma fonte externa, processá-las e responder em tempo real”, afirma o cientista.

A emissora lembra que minicérebros foram produzidos pela primeira vez em 2013, para estudar a microcefalia, distúrbio genético que leva à formação de um cérebro menor do que o normal. Desde então, eles têm sido usados ​​em diversas pesquisas. Mas o estudo atual é o primeiro a conectar as células cerebrais a um ambiente externo para serem capazes de interagir com ele – nesse caso, um jogo de computador.

Como mostra a BBC, os cientistas cultivaram o minicérebro a partir de células-tronco e de algumas células retiradas de embriões de camundongos, totalizando 800.000 estruturas neurais. Esse minicérebro foi conectado ao game por meio de eletrodos que informavam de que lado a bola estava e a que distância da raquete.

Em resposta, as células produziram atividade elétrica própria e gastaram menos energia à medida em que aprendiam a jogar.

 

As células cerebrais cultivadas em laboratório teriam sido capazes de “entender” o ambiente, mostrando características de seres sencientes  (Foto: Brett J. Kagan, Andy C. Kitchen et ali./Neuron/Divulgação)

 

Mas quando a bola passou pela raquete e o jogo recomeçou de forma aleatória, o minicérebro gastou mais energia recalibrando essa nova situação, considerada imprevisível. As células neurais aprenderam a jogar em cinco minutos, muitas vezes erravam a bola, mas a taxa de sucesso estava bem acima do acaso, revela a emissora britânica.

Apesar dessa capacidade, os cientistas afirmam que o minicérebro não sabia que estava jogando Pong da maneira que um jogador humano faria.

Brett Kagan espera que os achados possam eventualmente ser usados para criar e testar terapias voltadas a doenças neurodegenerativas, como Alzheimer.

“Quando as pessoas olham para tecidos em uma lâmina, elas observam se há atividade ou não. Mas o objetivo das células cerebrais é processar informações em tempo real. O foco na função primária delas desbloqueia outras áreas de pesquisa que podem ser exploradas de maneira abrangente”, comenta o pesquisador, citado pela BBC.

O próximo passo, de acordo com Kagan, é testar o impacto do álcool sobre a capacidade do minicérebro de jogar Pong. Se reagir de maneira semelhante a um humano, pode revelar o quão eficaz o sistema pode ser como um substituto em pesquisas de funções cerebrais.

É provável que os minicérebros se tornem mais complexos à medida que os estudos evoluem, mas a equipe liderada pela Cortical Labs está trabalhando com especialistas em ética científica para garantir que não criem acidentalmente um cérebro consciente. “Temos que imaginar essa nova tecnologia como nos primórdios da informática, quando os primeiros transistores eram protótipos malfeitos, não muito confiáveis. Porém, depois de anos de pesquisa, eles criaram maravilhas tecnológicas”, diz Brett Kagan.

Carregar Mais