Ciência

DNA adaptado ao clima extremo faz planta viver 2.000 anos na África

A Welwitschia resiste ao deserto de Namibe, que é extremamente árido, e alguns exemplares da planta são tão velhos que podem ter 3.000 anos

Por João Paulo Martins  em 01 de agosto de 2021

A resiliência e a longevidade da Welwitschia mirabilis no deserto de Namibe são fruto de um DNA que se adaptou há milhões de anos (Foto: Wikimedia/Thomas Schoch/Creative Commons)

Welwitschia mirabilis é a planta que vive mais tempo na natureza e pode ser encontrada apenas no clima extremamente árido do deserto Namibe, situado entre o sul da Angola e o norte da Namíbia, na África, e que recebe menos de 5 cm de chuva por ano.

Como mostra o jornal americano The New York Times, a Welwitschia é chamada “tweeblaarkanniedood”, em afrikaans, que significa “duas folhas que não morrem”. Claro que esse nome não podia ser mais adequado, já que a planta adulta possui apenas duas folhas e sua longevidade chega a 2.000 anos.

Essa capacidade de sobrevivência foi objeto de um estudo publicado dia 12 de julho na revista científica Nature Communications. Pesquisadores analisaram o DNA da Welwitschia para entender sua longevidade extrema e forte resiliência.

“A maioria das plantas desenvolve uma folha e é isso. Ela pode viver milhares de anos e nunca para de crescer. Quando para, está morta”, afirma o geneticista Andrew Leitch, da Universidade Queen Mary, de Londres, no Reino Unido, um dos autores da pesquisa, citado pelo jornal.

Os cientistas acreditam que algumas das maiores plantas tenham mais de 3.000 anos, com duas folhas crescendo continuamente desde o início da Idade do Ferro (1.200 a.C. a 550 a.C.), quando o alfabeto fenício foi inventado.

A Welwitschia mirabilis foi descrita pela 1ª vez em 1859 pelo botânico austríaco Friedrich Welwitsch, que deu o nome à planta.

Genética da resiliência

Curiosamente, o genoma da planta reflete o ambiente árido e pobre em nutrientes. Há cerca de 86 milhões de anos, após um erro na divisão celular, o DNA da Welwitschia foi duplicado durante um período de aumento da aridez e seca prolongada na região, segundo o botânico Tao Wan, do Jardim Botânico Fairy Lake, em Shenzhen, na China, principal autor do estudo, citado pelo The New York Times.

Ele lembra que o “estresse extremo” costuma estar associado a esses eventos de duplicação do genoma. No entanto, ter mais material genético tem um custo, revela Wan: “A atividade mais básica para a vida é a replicação do DNA, então se você tem um grande genoma, consome muita energia para manter a vida”, ainda mais num ambiente tão hostil.

Para piorar a situação, uma grande quantidade do genoma da Welwitschia é formada por sequências de DNA autorreplicantes consideradas “lixo”, conhecidas como retrotransposons. E os pesquisadores detectaram uma “explosão” da atividade dos retrotransposons entre um e dois milhões de anos atrás, provavelmente devido ao aumento do estresse climático.

Mas como forma de neutralizar esse acontecimento, o genoma da Welwitschia passou por mudanças que silenciaram as sequências de “DNA lixo. Este processo, junto com outras forças seletivas, reduziu drasticamente o tamanho e o custo de manutenção energética da planta, explica Tao Wan ao jornal americano. Com isso, a planta ficou com um genoma muito eficiente e de “baixo custo”.

O estudo também descobriu que a Welwitschia tinha outros ajustes genéticos “escondidos” em suas folhas. A folha média cresce a partir dos ápices da planta, ou topos pontiagudos de seu caule e galhos. Mas a ponta de crescimento original da Welwitschia morre e as folhas saem de uma área vulnerável chamada meristema basal, que fornece células novas.

O aumento da atividade de alguns genes envolvidos com metabolismo eficiente, crescimento celular e resiliência ao estresse pode ajudar na continuidade do crescimento sob o clima extremo, afirmam os cientistas.

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