Bem-Estar

É possível recuperar uma memória “perdida”?

Especialista fala sobre como as lembranças são acessadas e se na velhice podemos recuperar alguma memória supostamente “esquecida”

Por João Paulo Martins  em 06 de abril de 2021

(Foto: Freepik)

A gente é capaz de lembrar apenas uma pequena fração de tudo que aconteceu em nossa vida. Normalmente, quando um momento é considerado importante pelo cérebro, ele é transformado em memória, ao menos por um certo tempo. Será que é possível resgatar lembranças “esquecidas”?

Segundo o especialista em medicina interna Anthony Komaroff, professor da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, para transformar o momento em memória de curto prazo, armazenamos essa lembrança em fragmentos – cada pedaço é guardado numa região diferente do cérebro.

“As diferentes peças contêm a visão; o som; a reação emocional que tivemos na época; o lugar que aconteceu; quando aconteceu; e a relação com outras memórias. Coletivamente, todas essas peças da lembrança são ‘costuradas’ juntas no chamado engrama, que é uma combinação coerente de todas as peças”, explica o médico americano, em artigo publicado este mês no site da universidade.

Como mostra Komaroff, a “costura” das peças é realizada pelo fortalecimento das conexões entre as células cerebrais: momentos considerados importantes levam a conexões mais fortes.

Para acessar uma memória específica, a parte do cérebro chamada hipocampo recupera o engrama das diferentes regiões onde os pedaços dessa lembrança estão armazenados.

“Experimentos recentes em ratos mostram que se o hipocampo estiver temporariamente prejudicado, o acesso a uma memória será temporariamente perdido. O hipocampo ‘esquece’ brevemente o engrama que liga as peças da memória. Mas a lembrança ainda está lá, armazenada no cérebro. Quando a pesquisa foi publicada, alguns se perguntaram se isso significava que memórias perdidas poderiam ser restauradas em humanos”, conta o professor de Harvard no artigo recém-publicado.

Perda de memória na velhice

De acordo com Anthony Komaroff, seu colega Andrew Budson, cientista cognitivo que trabalha na mesma universidade, afirma que há duas maneiras pelas quais as memórias podem ser “perdidas” à medida que envelhecemos.

“Uma é simplesmente não encontrar a associação certa para acessar a memória. Ver uma pessoa, ouvir música ou cheirar determinado odor, pode subitamente trazer à tona a lembrança. O engrama de memória está intacto. Mas as lembranças podem se degradar com o tempo, o que infelizmente acontece com a maioria das memórias antigas. As que são perdidas na doença de Alzheimer e em outras demências se degradam e, provavelmente, nunca poderão ser recuperadas”, esclarece o especialista em medicina interna.

Ele lembra que a ciência ainda está começando a entender as conexões físicas e químicas que ocorrem no cérebro quando as memórias são formadas e acessadas.

“A memória não é mágica e a ciência a está descobrindo. É emocionante. Mas não tão excitante quanto poder, sempre que eu quiser, invocar a lembrança do rosto de minha esposa no momento em que nos casamos”, completa o cientista no artigo da Universidade de Harvard.

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